SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS VÃO À JUSTIÇA CONTRA AUMENTO NO DESCONTO PREVIDENCIÁRIO



Imagem capturada na Internet



Uma análise da inconstitucionalidade e ilegalidade das contribuições progressivas instituídas pela União para o Plano de Seguridade Social do servidor público. 










Por meio da Emenda Constitucional nº 103, de 12.11.2019, promoveu-se a mais nova Reforma na Previdência Social, alterando e inovando acerca de critérios etários, da fórmula de cálculo do salário do benefício, das regras aplicáveis a segurados situados em período de transição de regimes antecedentes e já com direito adquirido.

A citada Emenda alterou substancialmente as alíquotas de contribuição do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), como podemos ver:

Constituição Federal

Art.149, Parágrafo 1º.  (...) A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, por meio de lei, contribuições para custeio de regime próprio de previdência social, cobrada dos servidores ativos, dos aposentados e dos pensionistas, que poderão ter alíquotas progressivas de acordo com o valor da base de contribuição ou dos proventos de aposentadoria e de pensões.


A questão é que, para os servidores públicos federais que permaneçam vinculados ao RPPS, ou seja, não inseridos no Regime de Previdência Complementar, a Contribuição Social (CSPSSS) poderá atingir a exorbitante e insuportável alíquota de 22%  (vinte e dois por cento), podendo impactar numa alíquota efetiva de até 16,75 (dezesseis virgula setenta e cinco por cento), nos termos do art.11, §2º, da EC nº 103/2019, conforme a progressividade definida pelo art.11 da EC, dividida em 8 (oito) faixas percentuais, a saber:  7,5 (sete e meio por cento), 9% (nove por cento), 12% (doze por cento), 14% (quartoze por cento), 14,5% (quartoze e meio por cento), 16,5% (dezesseis e meio por cento), 19% (dezenove por cento) e 22% (vinte e dois por cento). É o que podemos conferir:

Art.11 Até que entre em vigor a lei que altere a alíquota de contribuição previdenciária de que tratam os arts. 4º, 5º e 6º da Lei nº 10.887, de 18 de junho de 2004, esta será de 14% (quartoze por cento).
§1º  A alíquota prevista no caput será reduzida ou majorada, considerando o valor da base de contribuição ou do benefício recebido, de acordo com os seguintes parâmetros:
I – até 1(um) salário-mínimo, redução de seis inteiros e cinco décimos pontos percentuais;
II – acima de 1 (um) salário-mínimo até R$ 2.000,00 (dois mil reais), redução de cinco pontos percentuais;
III – de R$ 2.000,01 (dois mis reais e um centavos) até R$ 3.000,00 (três mil reais), redução de dois pontos percentuais;
IV – de R$ 3.000,01 (três mil reais e um centavos) até R$ 5.839,45 (cinco mil, oitocentos e trinta e nove reais e quarenta e cinco centavos), sem redução ou acréscimo;
V – de R$ 5.839,46 (cinco mil reais, oitocentos e trinta e nove reais e quarenta e seis centavos) até R$ 10.000,00 (dez mil reais), acréscimo de meio ponto percentual;
VI – de R$ 10.000,01 (dez mil reais e um centavos) até R$ 20.000,00 (vinte e mil reais), acréscimo de dois inteiros e cinco décimos pontos percentuais;
VII – de R$ 20.000,01 (vinte mil reais e um centavos) até R$ 39.000,00 (trinta e nove mil reais), acréscimo de cinco pontos percentuais; e
VIII – acima de R$ 39.000,00 (trinta e nove mil reais), acréscimo de oito pontos percentuais.
§2º  A alíquota, reduzida ou majorada nos termos do disposto do §1º, será aplicado de forma progressiva sobre a base de contribuição do servidor ativo, incluindo cada alíquota sobre a faixa de valores compreendida nos respectivos limites.
§3º Os valores previstos no §1º serão reajustados, a partir da data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, na mesma data e com o mesmo índice em que se der o reajuste dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, ressalvados aqueles vinculados ao salário mínimo, aos quais se aplica a legislação específica.
§4º   A alíquota de contribuição de que trata o caput, com a redução ou a majoração decorrente do disposto no §1º, será devida pelos aposentados e pensionistas de quaisquer dos Poderes da União, incluídas suas entidades autárquicas e suas fundações, e incidirá sobre o valor da parcela dos proventos de aposentadoria e de pensões que supere o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, hipótese em que será considerada a totalidade do valor do benefício para fins de definição das alíquotas aplicáveis.


Ocorre que a Portaria nº 2.963, por sua vez, editada pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia em 03.02.2020, reajustou os valores previstos nos incisos II a VIII do §1º do art.11 da EC 103. Pela importância, trazemos:

Art.1º  Conforme §3º do art.11 da Emenda Constitucional nº 103, de 12 de novembro de 2019, os valores previstos nos incisos II a VIII do §1º do mesmo artigo, ficam reajustados em 4,48% (quatro inteiros e quarenta e oito décimos por cento), índice aplicado aos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
§1º  Em razão da reajuste previsto no caput do art.11 da Emenda Constitucional nº 103, de 2019, que entrará em vigor em 1º de março de 2020, será reduzida ou majorada, considerando o valor da base de contribuição ou do benefício recebido, de acordo com os seguintes parâmetros:

I – até 1 (um) salário mínimo, redução de seis inteiros e cinco décimos pontos percentuais;
II – acima de 1 (um) salário mínimo até R$ 2.089,60 (dois mil, oitocentos e nove reais e sessenta centavos), redução de cinco pontos percentuais;
III – de R$ 2.089,61 (dois mil, oitocentos e nove reais e sessenta e um centavos) até R$ 3.134,40 (três mil, cento e trinta quatro reais e quarenta centavos), redução de dois pontos percentuais;
IV – de R$ 3.134,41 (três mil, cento e trinta e quatro reais e quarenta e um centavos) até R$ 6.101,06 (seis mil, cento e um reais e seis centavos), sem redução ou acréscimo;
V – de R$ 6.101,07 (seis mil, cento e um reais e sete centavos) até R$ 10.448,00 (dez mil, quatrocentos e quarenta e oito reais), acréscimo de meio ponto percentual;
VI – de R$ 10.448,01 (dez mil, quatrocentos e quarenta e oito reais e um centavo) até R$ 20.896,00 (vinte mil, oitocentos e noventa e seis reais), acréscimo de dois inteiros e cinco décimos pontos percentuais;
VII – de R$ 20.896,01 (vinte mil, oitocentos e noventa e seis reais e um centavos) até R$ 40.747,20 (quarenta mil, setecentos e quarenta e sete reais e vinte centavos), acréscimo de cinco pontos percentuais;  
VIII – acima de R$ 40.747,20 (quarenta mil, setecentos e quarenta e sete reais e vinte centavos), acréscimo de oito pontos percentuais.
§2º  A alíquota, reduzida ou majorada nos termos do disposto no §1º, será aplicada de forma progressiva sobre a base de contribuição do servidor ativo de quaisquer dos Poderes da União, incluídas suas entidades autárquicas e suas fundações, incidindo cada alíquota sobre a faixa de valores compreendida nos respectivos limites.
§3º   A alíquota de contribuição de que trata o §1º, com a redução ou majoração decorrentes do disposto nos incisos I a VIII do mesmo parágrafo, será devida pelos aposentados e pensionistas de quaisquer dos Poderes da União, incluídas suas entidades autárquicas e suas fundações, e incidindo sobre o valor da parcela dos proventos de aposentadoria e de pensões que supere o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral da Previdência Social, hipótese em que será considerada a totalidade do valor do benefício para fins de definição das alíquotas aplicáveis.



Convém lembrar que a Contribuição Previdenciária do Servidor Público Federal já estava definida na Lei nº 10.887, de 18.06.2004, que assim dispõe:

Art.4º A contribuição social do servidor público ativo de qualquer dos Poderes da União, incluídas suas autarquias e fundações, para a manutenção do respectivo regime próprio da Previdência Social, será de 11 (onze por cento), incidente sobre:
§1º Entende-se como base da contribuição o vencimento do cargo efetivo, acrescidos das vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei, os adicionais de caráter individual ou quaisquer outras vantagens, excluídas:

I – as diárias para viagens;
II – a ajuda de custo em razão da mudança de sede;
III – a indenização de transporte;
IV – o salário família;
V – o auxilio alimentação;
VI – o auxílio creche;
VII – as parcelas remuneratórias pagas em decorrência de local de trabalho;
VIII – a parcela percebida em decorrência do exercício de cargo em comissão ou de função comissionada ou gratificada;
IX -   o abono de permanência de que tratam o §19 do art.40 da Constituição Federal, o §5º do art.2º e o §1º do art.3º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003;
X – o adicional de férias;
XI – o adicional noturno;
XII – o adicional por serviço extraordinário;
XIII – a parcela paga a título de assistência à saúde suplementar;
XIV – a parcela paga a título de assistência pré-escolar;
XV – a parcela paga a servidor público indicado para integrar conselho ou órgão deliberativo na condição de representante do governo, de órgão ou de entidade da administração pública do qual é servidor;
XVI – o auxílio moradia;
XVII – a Gratificação por Encargo de Curso ou Concurso, de que trata o art.76-A da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990;
XVIII – a Gratificação Temporária das Unidades dos Sistemas Estruturadores da Administração Pública Federal (GSISTE), instituída pela Lei nº 11.356, de 19 de outubro de 2006;
XIX – a Gratificação Temporária do Sistema de Administração dos Recursos de Informação e Informática (GSISP), instituída pela Lei nº 11.907, de 2 de fevereiro de 2009;
XX – a Gratificação Temporária de Atividade em Escola de Governo (GAEG), instituída pela Lei nº 11.907, de 2 de fevereiro de 2009;
XXI – a Gratificação Específica de Produção de Radioisótopos e Radiofármacos (GEPR), instituída pela Lei nº 11.907, de 2 de fevereiro de 2009;
XXII – a Gratificação de Raio X;
XXIII – a parcela relativa ao Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira, recebida pelos servidores de carreira Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil;
XXIV – a parcela relativa ai Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho, recebido pelos servidores da carreira de Auditoria- Fiscal do Trabalho, recebido pelos servidores da carreira de Auditoria-Fiscal do Trabalho;
XXV – o adicional de irradiação ionizante (vigência encerrada);
XXVI – o Bônus de Desempenho Institucional por Perícia Médica em Benefícios por Incapacidade (BPMBI); e
XXVII – o Bônus de Desempenho Institucional por Análise de benefícios com indícios de irregularidade no monitoramento operacional de benefícios (BMOB).




A par disso, a Lei nº 8852/1994 assim define remuneração:



Art.1º Para os efeitos desta lei, a retribuição pecuniária devida na administração pública direta, indireta e fundacional de qualquer dos poderes da União compreende:

I – como vencimento básico:

a) A retribuição a que se refere o art.40 da Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990, devida pelo efetivo exercício do cargo, para os servidores civis por ele regidos.
b) (...)
c) O salário básico estipulado em planos ou tabelas de retribuição ou nos contratos de trabalho, convenções, acordos ou dissídios coletivos, para os empregados de empresas públicas, de sociedades de economia mista, de suas subsidiárias, controladas ou coligadas, ou de quaisquer empresas ou entidades de cujo capital ou patrimônio o poder público tenha o controle direito ou indireto, inclusive em virtude de incorporação ao patrimônio público;

II – como vencimentos, a soma do vencimento básico com as vantagens permanentes relativas ao cargo, emprego, posto ou graduação;

III – como remuneração, a soma dos vencimentos com os adicionais de caráter individual e demais vantagens, nestas compreendidas as relativas à natureza ou ao local de trabalho e a prevista no art.62 da Lei nº 8.112, de 1990, ou outra paga sob o mesmo fundamento, sendo excluídas:
a) Diárias;
b) Ajuda de custo em razão de mudança de sede ou indenização de transporte;
c) Gratificação de compensação orgânica, a que se refere o art.18 da Lei nº 8.237, de 1991;
d) Salário-família;
e) Gratificação ou adicional natalino, ou décimo-terceiro salário;
f) Abono pecuniário resultante da conversão de até 1/3 (um terço) das férias;
g) Adicional ou auxílio natalidade;
h) Adicional ou auxílio funeral;
i) Adicional de férias, até o limite de 1/3 (um terço) sobre a retribuição habitual;
j) Adicional pela prestação de serviço extraordinário para atender situações excepcionais e temporárias, obedecidos os limites de duração previstos em lei, contratos, regulamentos, convenções, acordos ou dissídios coletivos e desde que o valor pago não exceda em mais de 50% (cinquenta por cento) o estipulado para a hora de trabalho na jornada normal;
k) Adicional noturno, enquanto o serviço permanecer sendo prestado em horário que fundamente sua concessão;
l) Adicional por tempo de serviço;
m) Conversão de licença-prêmio em pecúnia facultada para os empregados de empresa pública ou sociedade de economia mista por ato normativo, estatutário ou regulamentar anterior a 1º de fevereiro de 1994;
n) Adicional de insalubridade, de periculosidade ou pelo exercício de atividades penosas percebido durante o período em que o beneficiário estiver sujeito às condições ou aos riscos que deram causa à sua concessão;
o) Hora repouso e alimentação e adicional de sobreaviso, a que se referem, respectivamente, o inciso II do art.3º e o inciso II do art.6º da Lei nº 5.811, de 11 de outubro de 1972;
p) Outras parcelas cujo caráter indenizatório esteja definido em lei, ou seja reconhecido, no âmbito das empresas públicas e sociedades de economia mista, por ato do Poder Executivo.

§1º O disposto no inciso III abrange adiantamentos desprovidos de natureza indenizatória.

§2º   As parcelas de retribuição excluídas do alcance do inciso III não poderão ser calculadas sobre base superior ao limite estabelecido no art.3º.


Situada a questão, passamos a análise.



1. SOBRE A IMPOSSIBILIDADE DA UNIÃO INSTITUIR CONTRIBUIÇÕES PROGRESSIVAS PARA O PLANO DE SEGURIDADE SOCIAL DO SERVIDOR – PSS


De acordo com a iterativa jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é vedada a instituição de contribuição previdenciária progressiva, por dois motivos, a citar:

a)    A progressividade de tributos, com o fim de promover justiça fiscal, somente é admitida em relação aos tributos que a própria Constituição Federal especifica, não  havendo previsão para a contribuição previdenciária do servidor público para o PSS, tal como se dessume, a contrario sensu, por exemplo, da regra expressa do art. 153, §2º, inciso I, da Constituição Federal;

b)    Em face da garantia da irredutibilidade de subsídios, em conformidade com o art.37, inciso XV, da Constituição Federal, a instituição de alíquotas progressivas representa verdadeiro confisco dos subsídios/vencimentos dos servidores públicos. 



Cito, para exemplificar, os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Federal:


AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ALÍQUOTA PROGRESSIVA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.

1. Esta Corte já decidiu que a instituição de alíquotas progressivas para a contribuição previdenciária dos servidores públicos ofende o princípio da vedação à utilização de qualquer tributo com efeito de confisco (art.150, inciso IV, da Constituição Federal).
2. Agravo regimental não provido (RE 346197 AgR/DF-Distrito Federal, AgReg no Recurso Extraordinpario. Rel. Min. Dias Toffoli. Julgamento: 16/10/2012. Órgão julgador: Primeira Turma.



AGRAVO REIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. APELO EXTREMO EXTEMPORÂNEO. INTERPOSIÇÃO ANTES DO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS OPOSTOS CONTRA O ARESTO QUE JULGOU A APELAÇÃO. AUSÊNCIA DE RATIFICAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. SERVIDORES PÚBLICOS DO DISTRITO FEDERAL. MEDIDA PROVISÓRIA 560/1994 E REEDIÇÕES.  CONSTITUCIONALIDADE. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL.

1.  Conforme entendimento predominante nesta Corte de Justiça, o prazo para recorrer só começa a fluir com a publicação da decisão no órgão oficial, sendo prematuro o recurso que a antecede.  A insurgência, nesta hipótese, não se dirige contra decisão final da causa, apta a ensejar a abertura da via extraordinária, na forma do inciso III do art.102 da Carta Magna.
2. O Supremo Tribunal Federal decidiu no sentido de que o sistema de alíquotas progressivas, objeto da medida provisória 560/1994 e posteriores reedições, é constitucional, desde que respeitada a vacatio legis de noventa dias (art.195, §6º, da Constituição Federal).
3. Ressalvado, contudo, o entendimento pessoal desse relator quanto è idoneidade de medida provisória instituir alíquotas progressivas.
4. Agravo regimental desprovido (RE 400975AgRg/DF-Distrito Federal AgReg no Recurso Extraordinário, Rel. Min. Ayres Britto.  Julgamento: 08/02/2011, órgão julgador: Segunda Turma.




Como se observa, é de longa data que não se admite o custeio das contribuições previdenciárias dos servidores públicos da forma pretendida pela União, pelo que deve ser decretada a ineficácia da norma atacada, que estipula contribuições que variam de 7,5% a 22% dos Subsídio/Vencimentos dos servidores públicos, em conformidade com o art.11, da Emenda Constitucional nº 103/2019.

2. SOBRE OS SUCESSIVOS REGIMES DE TRANSIÇÃO IMPOSTOS AOS SERVIDORES PÚBLICOS, O QUE EVIDENCIA QUE A QUESTÃO ATUARIAL É SECUNDÁRIA E A REDUÇÃO DE SUBSÍDIOS/VENCIMENTOS É O VERDADEIRO OBJETIVO DA UNIÃO, DONDE SE EVIDENCIA O CARÁTER CONFISCATÓRIO DAS NOVAS CONTRIBUIÇÕES.


Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 adotou-se a nefasta “tradição” de reforma contínua do sistema previdenciário dos servidores públicos.  Relevante citar as reformas previdenciárias no texto constitucional que atingiram as expectativas dos servidores públicos federais: Emendas Constitucionais nºs. 20/98, 41/2003 e 103/2019, afora a grande reforma infraconstitucional havida com a Lei n. 12.618/2012.

Acrescente-se que o problema do crescente desequilíbrio atuarial do sistema foi resolvido com a entrada em vigor da Lei nº 12.618, de 30 de abril de 2012, que criou o Regime de Previdência Complementar dos Servidores Públicos. 

Assim, não se pode dizer que o sistema possui déficit atuarial crescente já que o atual regime está em extinção e os servidores públicos nele inseridos estão submetidos a regras de transição desde o longínquo ano de 1998, quando foi promulgada a Emenda Constitucional n.20.   Essa situação demonstra que a majoração de contribuição está sendo utilizada apenas como redutor/apropriação de parcela da remuneração dos servidores públicos, ressaindo da[i novamente o seu caráter confiscatório.

Desse modo, entendo demonstrada o caráter confiscatório do tributo em questionamento porque está a violar a garantia constitucional tributária (limitação ao poder de tributar) inscrita no art.150, inciso IV, da Constituição Federal, sendo consabido que as contribuições previdenciárias são espécies do gênero tributo, o que está referendado pelo STF, na jurisprudência transcrita acima.




3. SOBRE A AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE DESEQUILÍBRIO ATUARIAL ENTRE AS CONTRIBUIÇÕES PARA O SISTEMA DE PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS E DA UNIÃO E O FUNO AMEALHADO PARA CUSTEIO DOS BENEFÍCIOS AO LONGO DE VÁRIAS DÉCADAS, DONDE EXSURGE A VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL SUBSTANTIVO OU PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE.

Desde a instituição do Sistema de Previdência dos Servidores Públicos é mandamento legal e constitucional a gestão apartada dos recursos para custeio do PSS dos Servidores Públicos, tal como demonstra a legislação a seguir citada, lembrando que, no nível Constitucional, o caráter contributivo do sistema de previdência dos servidores públicos, do que resulta a necessidade de gestão apartada dos recursos, está previsto desde a primeira redação do art.40, da Constituição Federal.  No âmbito infraconstitucional, indica-se a seguinte legislação, que define bem a contribuição previdenciária do servidor público:

Lei nº 8.688/93

Art.3º A União, as autarquias e as fundações públicas federais participarão do custeio do Plano de Seguridade Social do Servidor através de:

I – contribuição mensal, com recursos do Orçamento Fiscal, de valor idêntico à contribuição de cada servidor, conforme definido no art.2º;

II – recursos adicionais, quando necessários, em montante igual à diferença entre as despesas relativas ao plano e as receitas provenientes da contribuição dos servidores e da contribuição a que se refere o inciso I, respeitado o disposto no art.17 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

Art.4º As contribuições de que tratam os arts.2º e 3º serão recolhidas ao Tesouro Nacional nos prazos e condições estabelecidos pelo Poder Executivo.


Lei nº 9.717/98


Art.2º  A contribuição da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios aos respectivos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos e dos militares não poderá exceder, a qualquer título, o dobro da contribuição do segurado.

(...)

§2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios publicarão até 30 (trinta) dias após o encerramento de cada bimestre, demonstrativo financeiro e orçamentário da receita e despesa previdenciárias acumuladas no exercício financeiro em curso (Redação dada pela Lei nº 10.887, de 2004). 


Lei nº 10.887/2004


Art.6º Os aposentados e os pensionistas de qualquer dos Poderes da União, incluídas suas autarquias e fundações, em gozo desses benefícios na data de publicação da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, contribuirão com 11% (onze por cento), incidentes sobre a parcela dos proventos de aposentadorias e pensões que supere 60% (sessenta por cento) do limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social.   (Vide Emenda Constitucional nº 47, de 2005)
Parágrafo único. A contribuição de que trata o caput deste artigo incidirá sobre os proventos de aposentadorias e pensões concedidas aos servidores e seus dependentes que tenham cumprido todos os requisitos para obtenção desses benefícios com base nos critérios da legislação vigente até 31 de dezembro de 2003.
...

Art.8º  A contribuição da União, de suas autarquias e fundações para o custeio do regime de previdência, de que trata o art.40 da Constituição Federal, será o dobro da contribuição do servidor ativo, devendo o produto de sua arrecadação ser contabilizado em conta específica.
Parágrafo único.   A União é responsável pela cobertura de eventuais insuficiências financeiras do regime decorrentes do pagamento de benefícios previdenciários.


A verdade é que nunca fora disponibilizada um sistema de contabilização das contribuições da União e dos servidores públicos para apuração do equilíbrio atuarial do sistema, de modo que o saneamento de uma apropriação de recursos pela União que serviram a todos os administrados, indistintamente, deve ser por todos suportados – e não só pelos servidores públicos federais.   Essa falta de transparência ocorreu ao menos até a criação do FUNPRESP através da Lei nº 12.618/2012.

Da situação acima exposta resulta clara a violação ao princípio do devido processo legal substantivo, também denominado pela doutrina de princípio da proporcionalidade ou proporcionalidade material, e que se encontra positivado no art.5º, inciso LIV, da Constituição Federal.

Recentemente, a questão foi enfrentada pela 11ª Vara da Seção Judiciária Federal no Estado do Rio de Janeiro, tendo sido concedida a tutela provisória de urgência na ação nº 5012245-85.2020.4.02.5101/RJ.  

A decisão  é do juiz federal Vigdor Teitel, que foi favorável aos servidores e dela destaco:


(...) Não se tem notícia de que a ré (União Federal) tenha criado a Unidade Gestora única ou Regime Próprio de Servidores Públicos Civis da União, conforme preconizado pela Emenda Constitucional nº41/2993, o que impede o processamento dos dados pertinentes por único órgão, e, via de consequência, inviabiliza o cálculo da avaliação atuarial de maneira fidedigna, a viabilizar a cobrança das contribuições em tela.
Embora a Emenda Constitucional nº 103/2019 não contenha determinação expressa de criação de Unidade Gestora, ao incluir o art.20 no art. 40 da CF/88, estabeleceu a necessidade de a Unidade Gestora do Regime Próprio da Previdência Social de cada ente da Federação.  Veja-se seu teor:
“§20   É vedada a existência de mais de um regime próprio de previdência social e de mais de um órgão ou entidade gestora desse regime em cada ente federativo, abrangido todos os poderes, órgãos e entidades autárquicas e fundacionais, que serão responsáveis pelo seu financiamento, observados os critérios, os parâmetros e a natureza jurídica definidos na lei complementar de que trata o §22.
Além disso, o inciso VII do parágrafo 22 do art.40 da CF/88 prevê que lei complementar federal estabelecerá as normas para a estruturação da entidade (órgão gestor de RPPS e o inciso IV da mesma norma, determina que lei complementar deverá criar mecanismos de equacionamento do déficit atuarial:
“Art.22 Vedada a instituição de novos regimes próprios de previdência social, lei complementar federal estabelecerá, para os que já existam, normas gerais de organização, de funcionamento e de responsabilidade em sua gestão, dispondo, entre outros aspectos sobre:
(...)
VI – mecanismos de equacionamento do déficit atuarial;
VII – estruturação do órgão ou entidade gestora do regime, observados os princípios relacionados com governança, controle interno e transparência.
Assim, é de se concluir que, para a eficaz implantação do novo regramento previsto, notadamente o disposto nos parágrafos 1º-A e 1º-B do art.149 da CF/88, faz-se necessário a existência de órgão/unidade de gestão do Regime Próprio de Servidores da União, principalmente diante da necessidade do correto processamento de dados para a real avaliação atuarial. 
Doutro giro, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a tributação confiscatória é vedada pela Constituição Federal de 1988.
Entendeu o STF, por unanimidade de votos, no julgamento da Medida Cautelar na ADI 2010-2/DF, Relator Ministro Celso de Mello, que o caráter confiscatório de determinado tributo resta demonstrado “sempre que o efeito cumulativo – resultante das múltiplas incidências tributárias estabelecidas pela mesma entidade estatal – afetar, substancialmente, de maneira irrazoável, o patrimônio e/ou os rendimentos do contribuinte”, e, ainda, que “o Poder Público, especialmente em sede de tributação (as contribuições de seguridade social revestem-se se caráter tributário), não pode agir imoderadamente, pois a atividade estatal acha-se essencialmente condicionada pelo princípio da razoabilidade.
...
Tais fatos, por si só, já são suficientes a demonstrar a plausibilidade do direito invocado pelo demandante.
Entendo, ainda, que o periculum in mora se encontra configurado, em virtude da possibilidade de cobrança imediata das aludidas contribuições, sem a devida demonstração do déficit atuarial. 
Ante o exposto, DEFIRO A TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA requerida para determinar a suspensão dos efeitos dos parágrafos 1º, 1º-A, 1º-B e 1º-C do artigo 149 da CF/88, na redação dada pelo artigo 1º da Emenda Constitucional nº 103/2019, parágrafos 4º e 5º do artigo 9º e caput, parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º do artigo 11, todos da mesma norma, e que a União se abstenha de implementar, em favor dos substituídos, a progressividade das alíquotas de contribuição previdenciária, bem como a instituição da contribuição previdenciária extraordinária, até ulterior decisão deste juízo.
Intime-se, com urgência, para ciência e cumprimento.
...




Em razão desses fatos e fundamentos, entidades sindicais e servidores, individualmente, já estão ajuizando em todo o país as suas ações a fim de obter a suspensão da cobrança de qualquer valor a título de contribuição para o PSS, com base no art.11, e seus parágrafos 1º e 4º, da Emenda Constitucional nº 103/2019, e para que se restabeleça o sistema de cobrança previsto no art.4º, I, da Lei nº 10.887/2004, com redação dada pela Lei nº 12.618/2012, no percentual de 11%, declarando-se incidentalmente a inconstitucionalidade destes dispositivos normativos nos termos acima expostos.

Na ação, os servidores também requerem a condenação da União (Fazenda Nacional), para que restitua tudo já cobrado com fundamento no art.11, e seus parágrafos 1º e 4º, da Emenda Constitucional nº 103/2019, incluindo  os encargos legais.

Há motivos para que sejam vitoriosas essas ações e que não demore a suspensão requerida. 

Vamos acompanhar e publicar aqui no blog.  

Um boa semana a todos!

Tribunal Regional Federal da 3a Região determina que União indenize familiares de um militar morto

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